sexta-feira, 12 de junho de 2009

As chagas de Marinho


A foto é minha. Tirei no dia 29 de dezembro de 2007, na comemoração patrocinada pelo ABC aos ex-atletas do clube. Burunga, Danilo Meneses, Alberi, todos presentes, além claro, de Marinho Chagas, nosso lateral da seleção brasileira. Foi Prudêncio que o trouxe do antigo (tão antigo assim?) e pequeno Riachuelo em 1970. E mesmo tendo jogado apenas um ano no ABC entrou no hall da fama do Mais Querido. Afinal, do ABC ele foi lançado à seleção. Bola de Prata pela revista Placar por 2 anos seguidos, 72 e 73, se destacava pela modernidade no futebol, jogando como um ala em tempos onde lateral apenas marcava. Estava à frente do tempo. Vejam que em 1972 foi um ano em que 2 jogadores (jogador e ex-jogador) do ABC ganharam o prêmio individual mais importante do futebol brasileiro: Marinho e Alberi.
A crônica abaixo, bem escrita por Roberto Campos, conta um pouco da tragetória de Marinho. Roberto falha - claro - pelo esquecimento do ABC Futebol Clube em sua crônica. Vamos ler:

No hospital a noite é longa. Sobra tempo pra voltar no tempo, vasculhar na memória os fatos mais distantes. Silêncio no corredor. Esqueceram o remédio da meia-noite. Quem sabe dá pra dormir um pouco sem o sedativo?
O velho campo dos Aflitos. Tudo era novidade pra quem vinha de Natal. Chegou no Náutico desconhecido. Cabelos louros. Cara de menino. Futebol de craque. Um repórter tascou precipitado:
"Chegou o amigo de Petinha! Será que joga alguma coisa esse rapaz?"
Primeiro treino. Bola presa entre os pés pela lateral. Cruzando o campo inesperadamente. Os companheiros observam o doido. A bomba sai violenta, letal, no ângulo: Reservas 1 x 0.
O Recife ficou pequeno em poucos meses. Fenômeno. Agnaldo Timóteo viu o menino jogando em Recife. Ligou pro Botafogo:
"Comprem! Urgente!"
Chegou no Rio com a mesma cara de menino.
"Domingo tu entra contra o Rei!"
Antes de o jogo começar, Pelé falou pra os companheiros:
"A mina é o Galego!"
Na primeira bola, Marinho se antecipa ao Rei e mete-lhe um chapéu. Como Garrincha nas canetas de Nilton Santos. Só que agora, Nilton Santos é Marinho. E Marinho é a alma do velho Garrincha. Infernizando os santistas. Impressionando o mundo. Desempregando os zagueiros que lhe fazem cobertura.
É convocado para a Seleção. Um holandês entre os brasileiros no Mundial de 74. Leão lhe desfere um soco depois do gol polonês.
"Irresponsável!"
Leão que falhara no primeiro gol holandês de Neeskens. Sem socos.
Amigos. Violão. Birita. Acorda no meio da madrugada. Sem saber onde está. Aos poucos recorda dos amigos de aluguel, das meninas, das noitadas. Os alemães sonham em levá-lo. Paul Breitner diz não!
"Gênio na esquerda aqui basta eu"
Marinho passeia entre os astros. No Cosmos. Aos poucos vai caindo na terra.
"Hepatite C, Marinho. Alcoolismo. Ou você deixa a bebida ou nada podemos fazer por você."
Mas como se a bebida é o último refúgio para as pernas que desobedecem ao drible? Como se apenas a bebida traz o Maracanã lotado? A defesa da Colômbia fechada. O chute que sai em curva, por sobre o arqueiro?
O copo sobre a mesa observa o antigo craque imaginando outro tempo.
Riachuelo.
Petinha morreu, Marinho.
Cadê o Arthur, o Dirceuzinho, o Jair, o Krol?
Quarenta e cinco minutos do segundo tempo.
0 x 0.
A vida encara o lateral esquerdo. Bola nos pés. Rente a lateral.
A vida faz que vai e vem. O lateral estático observa. Sua filha reza.
Marinho agora é o último homem.
Um drible pode ser fatal..
.


A Eureka está fazendo uma camisa especial para ajudar a família de Marinho. A ERK lança a campanha “Um gol pela vida”. Camisas serão vendidas por R$ 20,00 (vinte reais), a partir deste sábado (13), no dia do jogo com o Vila Nova, pela Série B, na loja ABC Shop, no estádio Frasqueirão. A arrecadação será destinada ao tratamento médico da “Bruxa”, como gosta de ser chamado. Familiares de Marinho Chagas estarão hj na lojinha do ABC, onde serão exibidas as primeiras camisas. Vamos todos colaborar com nosso ídolos.

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